Caras e caros colegas,
Nossos modestos recursos computacionais não nos permitiram adequar as
tabelas e algum texto a nosso formato. Mesmo assim publicamos este material da
psiquiatria da USP porque está excelente. Contamos com sua compreensão. ![]()
Relato de Caso
Tratamento homeopático da depressão:
relato de série de casos
Homeopathic treatment of depression: series
of case report
Ubiratan Cardinalli Adler1,
Nielce Maria de Paiva2, Amarilys
de Toledo César3,
Maristela Schiabel Adler4, Adriana Molina5, Helena Maria Calil6
1
Médico homeopata, mestre em Ciências, doutorando do Departamento
de
Psicobiologia da Universidade Federal de São Paulo/Escola
Paulista de Medicina (Unifesp/EPM).
2 Médica homeopata, assistente de Pesquisa Clínica – Pós-graduação em
Homeopatia da Faculdade de Medicina de Jundiaí (FMJ).
3 Farmacêutica homeopata, doutora em Saúde Pública, professora de
Pós-graduação
em Homeopatia da FMJ.
4 Médica homeopata, mestre em Ciências, professora da Pós-graduação em
Homeopatia da FMJ.
5 Farmacêutica homeopata, mestre em Ciências, professora da Pós-graduação
em Homeopatia da FMJ.
6 Médica psiquiatra, chefe da disciplina de Psicofarmacologia do Departamento
de Psicobiologia
da Unifesp/EPM.
Endereço para correspondência:
Helena Maria Calil.
Rua Napoleão de Barros, 925, Vila Clementino – 04024-002 – São Paulo, SP.
E-mail: hmcalil@psicobio.epm.br
Resumo
Contexto: Não há
estudos metodologicamente adequados sobre a eficácia da
homeopatia
na depressão. Relatos de casos clínicos são os
primeiros degraus da
evidência clínica, a caminho de estudos
controlados. Objetivos: Relatar
resultados preliminares
do tratamento homeopático de pacientes com depressão
no
SUS de Jundiaí. Métodos: Revisão
dos prontuários dos casos novos, atendidos
entre março
e dezembro de 2006. O diagnóstico foi confirmado por entrevista
estruturada. Os pacientes receberam homeopatia individualizada e a evolução
foi avaliada pela escala de Montgomery & Åsberg (MADRS). Resultados:
Foram
tratados 15 casos e observou-se resposta terapêutica (redução
maior que 50%
dos escores de depressão) em 14 pacientes (93%),
após uma média de sete
semanas de tratamento; um paciente
apresentou piora clínica e foi encaminhado
ao tratamento convencional.
O escore média (± dp) na Escala de Avaliação
de
Depressão de Montgomery-Åsberg diminuiu de 24,9 (±
5,8) a 9,7 (± 8,2, p < ,0001)
na segunda avaliação,
resultados mantidos no decorrer da terceira e quarta
consultas. Conclusões:
Os resultados sugerem que a homeopatia pode ser uma
alternativa terapêutica
no tratamento da depressão, mas estudos randomizados e
controlados
são necessários para se testar a eficácia e segurança
do tratamento
homeopático dos transtornos depressivos.
Adler U.C. et al. / Rev. Psiq. Clín
35 (2); 74-78, 2008
Palavras-chave: Homeopatia, depressão,
SUS, relato de série de casos.
Abstract
Background: Evidence for the efficacy
of homeopathy for depression is limited
due to lack of clinical trials
of high quality. Case reports are the first steps of
clinical evidence,
towards controlled trials. Objectives: To report preliminary
results of homeopathic treatment of depression in Jundiai’s public
health system,
Sao Paulo. Methods: Review of the medical
records of new patients, treated
between March and December 2006. Their
diagnosis was confirmed by a
semi-structured interview. Patients received
individualized homeopathy and their
response was measured by the Montgomery
& Åsberg depression scale (MADRS).
Results:
Fifteen patients were treated and response (more than 50% decrease of
MADRS scores) was observed in 14 patients (93%), after an average of
seven
weeks of treatment; one patient had clinical worsening and was
refered to
conventional antidepressant therapy. The MADRS mean scores
(± dp) decreased
from 24.9 (± 5.8) to 9.7 (± 8.2,
p < .0001) in the 2nd evaluation, and these results
signifcance were
sustained through the 3rd and 4th assessments. Discussion:
these results suggest that homeopathy may be an alternative therapeutics
for
depression, but randomized and controlled studies are needed to
test the efficacy
and safety of the homeopathic treatment of the depressive
disorders.
Adler U.C. et al. / Rev. Psiq. Clín
35 (2); 74-78, 2008
Key-words: Homeopathy, depression,
public health system, series of case reports.
Introdução
O tratamento convencional da depressão com
antidepressivos apresenta resposta terapêutica, ou seja, redução
maior que 50% do escore basal1
em torno de 50% a
60% dos pacientes tratados2.
Os antidepressivos não impedem altos índices de
recorrência
da doença3,4, produzem
efeitos adversos freqüentes e clinicamente
relevantes5,
sendo até evitados por pacientes mais idosos após uma
experiência
negativa com seu uso6.
A depressão é um dos principais motivos
para o uso de terapias alternativas e complementares nos Estados Unidos7
e o tratamento homeopático é uma das
alternativas terapêuticas
procuradas por esses pacientes.
A Homeopatia é uma terapêutica desenvolvida
pelo médico alemão Christian
Friedrich Samuel Hahnemann
(1755-1843), reconhecida como especialidade
médica no Brasil
desde 1980, reconhecimento reafirmado em 2002, por meio da
Resolução
CFM no 1634/2002.
A recém-publicada Portaria no 971 do Ministério
da Saúde (DOU, Seção 1, nº 84,
04/05/2006,
p. 20) aprovou a Política Nacional de Práticas Integrativas
e
Complementares (PNPIC), estabelecendo diretrizes para a incorporação
da
Homeopatia ao SUS e para avaliação da atenção
homeopática em parceria com
instituições formadoras,
universidades, faculdades e outros órgãos dos governos
federal, estaduais e municipais.
Antecipando-se à Portaria 971, em agosto
de 2003 a Faculdade de Medicina de
Jundiaí, São Paulo,
inaugurou o único curso de Especialização em Homeopatia
no
país oferecido por uma Faculdade de Medicina e aprovado pelo
Conselho Estadual
de Educação (http://www.fmj.br).
A partir de fevereiro de 2004, o ambulatório-escola
de Homeopatia passou a
funcionar como um serviço de atenção
secundária à saúde, recebendo
encaminhamentos da
rede básica, direcionados para a primeira especialidade ou
projetos
de pesquisa dos preceptores, como é o caso do ambulatório
de
homeopatia e transtornos depressivos.
Se ainda não existem evidências científicas
favoráveis ao uso da Homeopatia na
depressão, também
não as há em contrário, pois os poucos estudos
clínicos
existentes não são metodologicamente adequados8.
Assim apresentamos a seguir uma série de
casos clínicos de depressão tratados exclusivamente com
Homeopatia no Ambulatório de Homeopatia e Transtornos
Depressivos
no SUS de Jundiaí.
Metodologia
Foram revisados os prontuários dos pacientes
que tiveram sua primeira consulta
entre março e dezembro de 2006.
Pacientes encaminhados ao ambulatório de
Homeopatia e transtornos depressivos pelo sistema de referência
e contra-referência do SUS de Jundiaí passaram por uma
pré-consulta, na qual foram submetidos a uma entrevista clínica
estruturada para
o diagnóstico da depressão, segundo os
critérios do DSM-IV (SCID9).
Aqueles que preencheram os critérios diagnósticos
de um episódio depressivo
foram esclarecidos sobre a falta de
evidências científicas da efetividade da
Homeopatia no
tratamento da depressão e, após terem assinado um termo
de
consentimento livre e esclarecido, foram agendados para o início
do tratamento homeopático, no primeiro horário disponível.
Antidepressivos eventualmente em
uso foram descontinuados de forma gradual
até a ocasião da primeira consulta
homeopática.
Nos casos relatados, as consultas ocorreram aproximadamente
a cada sete
semanas e foram precedidas por uma avaliação
do escore de depressão por meio
da aplicação da
escala de Montgomery & Åsberg (MADRS).
A escala MADRS foi escolhida por sua maior sensibilidade
às mudanças na
sintomatologia depressiva10,11.
Nessa escala, escores menores ou iguais a 10
caracterizam a remissão
do episódio depressivo1.
Cada paciente recebeu um medicamento individualizado
para o seu caso de
doença, preparado e administrado de acordo
com a metodologia hahnemanniana1
2.
Utilizou-se a análise unidirecional de variância
de medidas repetidas com última
observação levada
à diante (LOCF) para comparação das avaliações
em quatro
períodos. Quando se identificaram diferenças
significativas, aplicou-se uma
análise post hoc, usando-se o
teste de Bonferroni para comparações múltiplas13.
Valores de p menores que 0,05 foram considerados significativos.
Este relato de casos clínicos foi aprovado
pela Comissão de Ética em Pesquisa da
FMJ.
Resultados
Nos sete meses entre março e outubro de
2006, foram atendidos 15 casos novos,
dos quais apenas um do sexo masculino.
A idade variou de 23 a 70 anos, com
média de 43,1 anos, e a escolaridade,
do 1º grau incompleto até o mestrado. A
tabela 1 resume
as características sociodemográficas dos pacientes atendidos.
A tabela 2 resume as comorbidades apresentadas
pelos casos relatados e a
respectiva medicação convencional
(quando em uso).
O tempo transcorrido entre a primeira consulta
e o primeiro retorno foi, em média,
sete semanas (4 a 22 semanas).
Os 15 pacientes compareceram ao primeiro
retorno, dos quais 12 foram
reavaliados em relação ao escore de depressão.
Treze pacientes compareceram ao segundo retorno, que ocorreu, em média,
7,5 semanas (4 a 14)
depois do primeiro, sendo todos avaliados em relação
ao escore MADRS. Apenas
cinco pacientes já compareceram a um
terceiro retorno.
Dos 15 casos relatados, 14 (93%) apresentaram resposta
terapêutica, e destes 13
(87%) evoluíram com remissão
do episódio depressivo. Um paciente referiu piora
da ideação
suicida na quarta semana, sendo medicado com fluoxetina e
encaminhado
ao ambulatório de saúde mental, onde voltou a fazer tratamento
convencional, com melhora do quadro depressivo.
A tabela 3 traz a duração da depressão
e do episódio depressivo, os escores de
depressão MADRS
pré-tratamento (basal) e no primeiro e segundo retornos, bem
como o medicamento homeopático utilizado no tratamento de cada
paciente.
O escore MADRS apresentou redução
da média basal de 24,87 (± 5,81) para 9,73
(± 8,16)
no primeiro retorno (p < 0,0001). A tabela 4 apresenta a média
dos
escores MADRS em cada tempo de avaliação, considerando-se
a última
observação
levada adiante (LOCF).
A figura 1 ilustra a evolução da
média dos escores de depressão (LOCF) no
decorrer do tratamento
homeopático.
Durante o período de tratamento relatado,
alguns casos também apresentaram
modificações importantes
nas comorbidades. Os pacientes no 1 e no 5
emagreceram 15 e 8 kg, respectivamente.
A paciente de no 9 apresentou remissão
das crises de pânico
e a paciente de no 4 apresentou rebrotamento capilar na área
de alopecia.
Discussão
Séries de casos clínicos estão
no penúltimo degrau dos níveis de evidência
científica,
ficando acima apenas da opinião de especialistas. No ápice
da escala
estão os estudos randomizados e controlados e suas
respectivas revisões
sistemáticas14.
Uma revisão sistemática recente8
encontrou apenas dois estudos randomizados
sobre o tratamento homeopático
da depressão como principal diagnóstico. Em
ambos foram
identificados problemas metodológicos, como a não-descrição
da
randomização e número insuficiente de pacientes
recrutados, impedindo quaisquer
conclusões sobre a eficácia
do tratamento.
Entre as causas apontadas para a escassez de publicações
de qualidade que
avaliem o tratamento homeopático da depressão,
incluem-se:
A melhora observada nos casos relatados pode ser
resultado da remissão
espontânea do episódio depressivo,
ou mesmo do efeito placebo, responsável, em
média, por
30% de resposta terapêutica em pacientes com depressão16.
Para
avaliar a eficácia do tratamento homeopático, propusemos
um estudo
randomizado, controlado e duplo-cego, comparando o uso da
homeopatia com
placebo no tratamento da depressão, mas este não
foi aprovado pela Comissão
Nacional de Ética em Pesquisa
(parecer CONEP no 316/2005). O braço placebo
não foi aceito,
tendo a CONEP sugerido a realização de um grupo-controle
ativo,
tratado com um antidepressivo consagrado.
Apesar dos questionamentos que possam ser feitos
acerca da validade de estudos
sobre novas medicações contra
depressão que não incluam um grupo placebo16, readequamos
nosso projeto para comparar o tratamento homeopático a um
controle
ativo (estudo em andamento), pois entendemos ser necessária a
avaliação científica e imparcial da Homeopatia
oferecida no SUS, conforme preconizam as diretrizes
do Ministério
da Saúde.
Agradecimento
À Farmácia HN-Cristiano, de São
Paulo, pela doação dos medicamentos
homeopáticos.
Referências
|
Órgão Oficial do Departamento e Instituto
de Psiquiatria
Faculdade de Medicina - Universidade de São Paulo |